quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

O que vem aí? #2





















Este post é uma continuação dos comentários ao post de ontem "O que vem aí?" O meu texto é demasiado grande para caber nos comentários desse post. Leiam lá primeiro e depois se quiserem continuem aqui.

...

OK. Cada um come o que quer. E tal como diz o povo. Nada de emprenhar pelos ouvidos. Cada um que faça o trabalho de casa.
Mas deixamos os media em roda livre?! ... a emprenhar os ouvidos dos outros!?

Quase todos os dias nos põem notícias nas televisões e nos jornais que não são rigorosas e muitas vezes até são mentiras.
Seria tão fácil dar exemplos como este, repentinamente tão actual. Há uns tempos o Expresso publica uma entrevista a João Cravinho sobre a corrupção em Portugal e atribui-lhe uma ideia que ele diz não corresponder ao que afirmou nessa entrevista. É numa outra entrevista mais tarde num programa da RTP2 sobre o mesmo tema que ele faz essa acusação repondo a verdade e encolhendo os ombros em relação à mentira que ficou. Já agora lembro que ele concluía que a “corrupção em Portugal está bem e recomenda-se”... Isto foi há uns tempos. E nós a vê-los agora a passar.

Não podemos contornar o facto de os media terem o papel decisivo na percepção que as pessoas têm do mundo que as rodeia. E é muitas vezes a partir desse retrato do mundo que iniciamos as nossas reflexões e julgamentos. Que será de nós se não formos mais exigentes com os (nossos) media?

Eu aproveito o que ocorreu num programa da televisão pública com o insuspeito D. José Policarpo para dar um exemplo. Trata-se de um programa de elevadíssima audiência numa televisão pública e a "jornalista" repetia uma mentira.

Volto a lembrar que muito me agradaria que os bispos e o próprio Papa fossem contra esta ministra da educação, mas tal facto era mentira e daí o meu espanto pela "jornalista" difundir informação errada. Só a (vamos chamar-lhe)“elegância” de D. José Policarpo o impediu de corrijir a jornalista na primeira vez. E é tal o desconforto quando a ouve a segunda vez que até se justifica antes de a desmentir. Vale a pena rever a 2ª parte do programa no site da RTP para ver a cara de espanto e desconcerto de D. José Policarpo.
Se calhar o tal bispo presidente da Conferência Episcopal também já desmentiu essas notícias e esclareceu que a posição era "pessoal e intransmissível", mas isso ninguém leu, pois não? Nem a "jornalista" do Prós e Contras. Se calhar encolheu os ombros como o Cravinho. Se calhar. Se calhar.


É pena que os programas que debatem as questões relacionadas com a informação nos media, como o "Clube de jornalistas", estejam "escondidos" na RTP2 a uma hora que ninguém consegue ver. Ou que as melhores entrevistas apareçam à hora da novela.

Quanto à mentira sobre a avaliação dos professores que, tristemente, reconheço ter colado, remeto para o artigo do José Gil que coloco neste post. Tal como as palavras de D. José Policarpo mereciam ser escutadas letra a letra, também o texto de José Gil merece ser lido com muita atenção. (jura!!!)

A contestação dos professores é muito interessante, ultrapassa muito a questão da avaliação e muito as questões corporativas. Essas questões também estão lá naturalmente e legitimamente.

E quanto ao modelo de avaliação apetece-me fazer uma pergunta. Assumamos que o ensino secundário privado, (goste-se ou não), leva a sério a formação dos seus alunos. Alguém acredita que nessas escolas optassem por um modelo de avaliação que tornasse a vida do professor na sua escola num inferno?

Mónica, se te apetecer lê o José Gil e depois manda lá porrada :)

Noutro dia vi um filme interessante na televisão que abordava também o poder da mentira nos media e os interesses que essa mentira serve. "Mr. Smith Goes to Washington" de Frank Capra, 1939.

11 comentários:

Mónica (em Campanhã) disse...

vou ler, Luís, vou ler. mas a pergunta que pões (privado vs público) é virtual visto que no privado a questão começa muito antes da avaliação: no colégio dos meus filhos (para onde os mudei, sublinho, após alguns anos de fundamentalismo pró-público, que resultou desastroso) os profs são escolhidos a dedo pela direcção e não por um concurso que os seria por uma nota obtida sabe-se lá como; estão à experiência antes de passarem ao quadro; as opiniões dos pais são tidas em conta, claro, seria insustentável um prof de quem a generalidade dos pais pensasse mal (e sei, porque sou mãe e porque falo com outras mães e já passamos por uma mudança de prof do 1º para o 2º ano da I, que isto não depende das notas, mas da competência percebida, da exigência com as crianças e, claro, do clima de afecto da sala de aula).

quanto aos jornais, não posso esquecer aquela do Público há uns tempos, em que um jornalista e um cantor (acho que o Camané) dissertavam sobre o poema do J Brell "ne me quittes pas", mais concretamente sobre a frase "laisse moi devenir, l'ombre de ton ombre, l'ombre de ton chien", que cuidavam ser o ombro do cão, expressão máxima de solidão, só ter um ombro de cão onde chegar. isto saiu num jornal com o gabarito do Público, falou-se em 2 ou 3 blogs e as pessoas continuaram a comprar o jornal. mas eu já não sou capaz.

Nossa disse...

Para deixar de ser virtual basta aplicá-lo.
Se no público foram mal seriados, então a avaliação, por exemplo segundo o modelo do privado, tirava isso a limpo.

Se no privado foram escolhidos a dedo, então o que pode acontecer é terem melhores notas.
Vivemos todos bem com isso.

Quanto aos jornais. O meu corte com o Público aconteceu aquando da guerra do Iraque. Mas ainda vou lá ler um ou outro artigo.

É melhor começarmos a introduzir temas relacionados com a época Natalícia.

E para já um belo Natal para todos vós com as vossas famílias.

Mónica (em Campanhã) disse...

eu diria que é Natal (e conversa natalícia) sempre que saio de mim e penso no próximo e num mundo melhor. feliz Natal também para ti, para todos os BKC e famílias.

Rui disse...

Agradeço os votos, Mónica. E desejo o mesmo para ti e para os teus.
Jingle bells…

Não estou com muita vontade de teclar mas não resisto a deixar um comentário:
A questão da avaliação dos profs, tal como é colocada frequentemente pela vox populi, faz-me lembrar o que aconteceu, sobretudo na primeira vez, aquando da discussão para a consulta popular para a despenalização do aborto. Correram rios de tinta e esganiçaram-se vozes a discutir acaloradamente sobre estar-se a favor ou contra o aborto, esquecendo-se a verdadeira questão que pretendia ajudar a solucionar um problema real. Não conheço ninguém que esteja a favor do aborto e creio que ninguém acredita conhecer alguém que tenha essa opinião. Uma conversa de surdos assaltou o país numa ruideira estéril e de cariz moralista. Uma pena.
Quanto à avaliação dos profs, parece-me novamente leviano ser-se simplista. É inquestionável que uma avaliação é bem-vinda, discute-se (ou devia discutir-se) é a forma como ela é feita. De resto, não é nada que se tire a limpo com qualquer prof do ensino secundário (todos nós conhecemos alguém). Concordo e entendo o que a Mónica expôs. Também tenho filhos, o que pode ajudar a entender a importância do assunto, mas uma vez mais tenho pena de assistir à facilidade com que se perde tempo a evitar tratar seriamente de assuntos socialmente relevantes.

Rui disse...

O filme de que falas é muito fixe. E o Capra um realizador genial.
Relembro um outro, do Sidney Lumet, que tenho a certeza que irás gostar: "The Network", 1976.
E depois, claro, os filmes do Costa-Gravas e do Samuel Fuller. "The Insider" de Michael Mann, é outro que irás curtir, se não viste ainda.

Nossa disse...

Não sei como é que rebolámos para a “velha” polémica do ensino público vs ensino privado. Eu sugeria apenas aproveitar o melhor dos dois mundos. Até pode ser só o giz.

Quanto à educação (mais do que a escola) a mim preocupa-me chegarmos a um momento em que o diálogo é impossível.

Quando comprei a minha casa percebi que a lareira estava mal feita. Tratei de ler os folhetos (por acaso em francês) e depois expliquei aos meus vizinhos porque é que nenhuma aquecia. Havia 24 lareiras todas igualmente mal executadas. Quando expliquei o mesmo aos construtores o diálogo parecia impossível. Não encontrava sequer as palavras. No final de uma explicação com todos os desenhos ainda me perguntavam porque é que achava que aquilo é que estava correcto. Desesperado respondi: Porque acredito na ciência! (dasse)

Este fenómeno já se passou comigo em diversas ocasiões. Por isso parece ser urgente (vá lá riam-se) ensinar a pensar.
Percebem o que está em jogo? Lembrem-se que nunca terão mecânicos saídos do Colégio Francês. Camionistas saídos do Colégio Alemão. É preciso formar todos e que todos têm de compreender o que é a ética, de ter orgulho no conhecimento, de terem profissionalismo mesmo que seja nas funcões mais simples? É desses que falo.

Não vamos desistir da educação. Não vamos promover “novas oportunidades” que apenas constroem estatísticas perversas que se viram contra nós. (ai viram viram, esperem só!)
Vamos mas é promover a educação e Novas Oportunidades.

E os professores têm a oportunidade de fazer a diferença nesta sociedade egoísta e letárgica.

Tantas vezes me lembro do Dr Fernando Nobre da AMI que apelava em último recurso a um certo egoísmo pois dizia ele mais ou menos isto, se não cuidarmos dos tais outros, eles virão por aí fora e serão aos milhões.
Estão a imaginar a contestação nas ruas por pessoas que não compreendem o mundo que os rodeia? Isso já não vai ser como Atenas, hoje, que não está nada bonito e se tratam de estudantes.
Vai ser uma balbúrdia.

Querem rir-se? Conheço um professor universitário que apanhou um aluno a beber cerveja na aula. E isto é a ponta do icebergue.

Jingle Bells

Mónica (em Campanhã) disse...

pois, Luís, eu, racionalmente, estou tão pessimista quanto tu. mas depois sei, intuitivamente, que o mundo acaba por ser mais nivelado e as coisas quase de certeza permanecerão apenas na mediocridade.

acuso o toque do mecânico que não sai do colégio alemão, mas não confirmo: acho que do colégio dos meus filhos pode sair (um mecânico ou um DJ ou um talhante, que são as profissões de alguns dos pais dos amigos dos meus filhos), é um colégio muito pouco elitista, garanto-te. mas acho que de lá sairão, isso sim, muito menos delinquentes que da escola pública que nos caberia em sorte aqui na zona.

tem a ver com os recreios (onde estão permanentemente professores e funcionários), com o afecto, com o espírito de camisola, com a forma como lidam com o bullying, com ligação que há com os pais, etc.

como fazer a escola pública aderir a estes modelos?

Nossa disse...

Ok. Mas é uma mediocridade de óptima qualidade, dados os resultados :)

Já agora. Para mim as elites têm uma razão e uma função própria.
Não se pode é falsear o processo de formação das elites desiquilibrando as oportunidades à partida ou pura e simplesmente ignorar no final quem trabalhou para o merecer.

Por exemplo. Há muito mais mulheres na universidade e por isso no final há muitas mais mulheres entre os melhores. Certo?
Então onde estão elas quando se trata de ocupar os merecidos lugares?

Rui disse...

Essa sempre me intrigou (estou a ser irónico,claro).
Até no Irão, onde mais de 90% dos estudantes universitários são mulheres parece haver algo na sociedade que faz desaparecer essas pessoas para algum lado. Estranhei haver tantos senhores no poder e tão poucas senhoras. Quererá isso dizer que num país como esse, o tempo da elite das senhoras está para vir, e que é só uma questão de tempo?

Mónica (em Campanhã) disse...

este tb é um tópico que provoca a conversa. é assim em toda a parte. nos centros de saúde, quase só há mulheres mas os homens estão quase todos nas posições cimeiras.

e não acho que isso seja discriminação nem que se resolva com quotas. querem saber porquê? porque as mulheres não querem esses cargos. as mulheres têm muito, mas muito, menos apetência por posições de poder.

(mandamos em casa e já nos chega....... esta foi só para desestabilizar)

disse...

O que eu acho é que a escola está desenhada para os interesses e formatos femininos. Talvez 90% dos docentes do 1º e 2º ciclo (que é quando se ganha gosto ou aversão à escola) são mulheres.
os rapazes que se adaptem, se quiserem. As actividades de escrever, ler e contar que constituem o "centro" do ensino são interessantes e apelativas para as meninas, e menos para os meninos. Porque é que jogar a bola e construir caixotes, montar aparelhos e fazer corridas não são coisas que se ensinem na escola, em Portugal? A maioria dos rapazes gostaria. Há um livro do excelente antropólogo Miguel Vale de Almeida, "Senhores de Si", sobre a construção da masculinidade muitíssimo interessante e que dá boas pistas sobre essa coisa. De igual modo o ensaio de Sally Cole sobre as mulheres pescadoras de Vila Chã "Mulheres da Praia" ensina bastante sobre o papel da mulher e o seu "controle" sobre a familia e a sociedade...
A escola é fixe quando não é homogeneizada com 300 outras. É fixe quando pode construir o seu próprio projecto em função da malta que lá está. Isso é que é fixe.
A avaliação dos professores na minha opinião é um disparate e uma tragicomédia.