segunda-feira, 7 de julho de 2008

A chegar a Cadavão

Há uns anos circulava no meu carro a uns 20 à hora numa confusão de trânsito na estrada velha para Espinho, onde é a academia de música do Hugo. A certa altura apercebo-me de um homem a correr ao lado direito do meu carro com um pequeno saco na mão. À medida que o trânsito ía avançando parecia-me que ele tentava apanhar uma camioneta que ía um pouco mais à frente naquela confusão. O homem era quase atropelado porque a camioneta preparava-se para virar à esquerda para Cadavão (antes da Quinta da Formiga) e ele teve de cruzar enviesado o trânsito todo.

Tinha um ar magricela e notava-se que a corrida lhe estava a custar. Quando o apanhei de novo do lado direito da estrada aproximei-me já com a janela aberta mas ele nem reparava em mim. Tive quase de lhe encostar o carro para lhe oferecer boleia sempre em andamento. Ele lá parou e respondeu que tinha que apanhar a tal camioneta.
“Entre” disse-lhe eu. E num estante apanhámos a camioneta seguindo-a até à primeira paragem. Durou uns 3 minutos, talvez.
Explicou-me apressadamente que a filha dele ía naquela camioneta com a ex-mulher e que ela não o deixava vê-la há uma série de tempo (ele disse-me quantos dias mas não me lembro).

Era de certeza alguém que trabalhava na construção civil. Tinha as calças sujas de cimento ou tinta, não me lembro bem. A camisa e os sapatos eram “novos”. Lembro-me de pensar que aqueles sapatos não ajudavam nada à corrida naquela velha estrada de paralelo grosso. O saco de plástico que tinha na mão devia ser a restante roupa do trabalho.
Deixou-me apressadamente saindo pela porta fora para acabar a corrida, agora mais curta. Disse-me que ela morava logo alí e que mal entrasse em casa já não conseguiria ver a filha.

4 comentários:

Nossa disse...

Nao estou com tiques literários. Mas tinha que vos contar estes pequenos episódios twilight zone.

Rui disse...

Obrigado por partilhares.
Eu cá, acho estes nacos de vida uma delicia!

Mónica (em Campanhã) disse...

podia bem ser o princípio de um filme

Rui Lopes disse...

A sensibilidade em tipos rudes é uma coisa magnífica. Uma vez assisti a um telefonema delicioso. Um mecânico que eu conhecia como um bruto e que estava connosco no rally dos açores, ligou à família (mulher e filha adolescente) para a encher de beijinhos e a dizer que estava a morrer de saudades. Até senti um nó!